terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Das cem vezes que morri



  Hoje ainda não morri, acordei com paralisia imaginativa. Estranho se eu pensar que todos os dias morro pelas causas mais e menos improváveis. Das vezes que pulei em um piscina, eu não só me afoguei como bati a cabeça na borda, no fundo, tive o cabelo sugado pelo ralo e em todas as vezes sem exceção, eu morri. Já atravessei a rua e levei um tiro na cabeça, no peito, na barriga. Já recebi facadas e fui surrada. Capotagem, naufrágio, explosão, incêndio, quedas de todos os tipos. Lápis enterrado no meu globo ocular. Sem contar das vezes que eu própria me matei. Pulso cortado, enforcamento, sufocamento. Em todos esses casos eu morri. Pessoas choraram, sentiram a minha falta, superaram a perda e seguiram esquecendo. Hoje ainda não matei ninguém, não perdi ninguém, não casei, não menti a minha realidade uma vez sequer.

  Não me lembro bem quando tudo começou a ficar tão intenso, acho que morrer dia após dia foi minha forma de superar meus algozes. E ninguém vê isso. Tenho uma natureza mentirosa, doente. Sem contar pra qualquer um o que ainda me perturba vou criando mundos fantásticos. Já salvei a vida dela um punhado de vezes, já fui feliz outro punhado, me fiz esquecer de tudo, mas não o tempo todo.

  Vejo em flash. Fico na duvida sem saber quando estou inventado, quando estou lembrando. Será que aconteceu mesmo? Me pergunto. Estabeleço um padrão de vida sem identidade. Me perco. Travo uma luta histérica, carregada em conservadorismo inútil e tudo por medo de me assumir plenamente. Repressão não é uma prática, é um ensinamento. Eu tive anos para aprender, logo, mesmo condenando ainda aplico este saber em mim mesma (até hoje). Contudo, se me perguntar sobre isso e a razão de eu ser assim como sou, negarei. Assumindo a possibildade de eu estar morta bem ali na sua frente enquanto me questiona. Bem possível também que quem estivesse morrido fosse você.

Calma, permanecerei aqui. Não só por toda a obsessão  pela felicidade, mas pela obsessão por amar e pelo prazer de morrer cem vezes ao dia. Por você que gosta de mim, por ela que amo tanto, por sonhos que ainda tenho e conquistas que não fiz. Ao menos eu espero ser suficiente. Porque enquanto eu só imaginar estarei bem. Natureza mentirosa lembra?


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